quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Sentimento de hoje

como posso transmitir
em morse libras ou alternadas do espírito
nos tão binários ou nas línguas que por pouco não convencionamos
que o dia choveu em pingos de doce de leite
que os vermes que róem passaram a ler e já comem os clássicos - os danados!
que a palma da mão que hoje abri tivera um punhado de eu fechado
com quem eu nunca que não falou nenhum sim?

no começo, foi o sim. e como começasse, já tem mais o que fazer

- fora Amiel, e às bocas virgens de tanger o mundo!

sábado, 21 de novembro de 2009

Proposição XXVII

Eu que ontem pensei de outra forma
Eu que ontem fechei minhas mãos sobre o teu punho
Eu que corri meu tempo para antes da luz diária
Eu que não me dei conta de como teus pés iam à frente
Eu que não os entendi se deixarem tropeçando
E, pateticamente caído, quando dormiste extenuado e entregue
Eu que beijei desesperado as costas abertas de manhã
As que nem eram tuas, mas as de quem não tenho
Eu que só soubesse intentar super-homens

Eu que ontem pensei de outra forma
Eu que não tive com o que preparar a mesa do café
Eu devia preparar um café para o mundo
E chamar os convivas que não depreciam nossa mesa
Eu devia ter tropeçado, mas caí antes de andar
E puxei até o último hausto o teu sorriso solícito
Eu que ontem tive a estrela da vida
Eu que ontem investi cego na verdade luminosa
Eu que andei sem lentes com que visse a verdade
Eu que nunca entendi de óptica

Meu peito está aí construído
E penso que o essencial é perder a guerra e viver derrotado
Eu que não alimento o cruel nacionalismo
Eu que sei de história, mas não de óptica
Eu que perdi o rosto numa guerra civil
Eu que dei um hematoma à estrela do país
Eu que venci a mim e me decepei o peito
Para montar um repasto ao vencedor de mim

Eu quero um armistício, amor, eu quero ócio
Eu quero descanso sob a estrela do equinócio
Eu quero assinar que desisto

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Ar seco

Vivo seco
como a noite seca depois do dia
os enxarcamentos, os transbordamentos
ficaram nos ares retidos

Foi fértil o dia, como caquis no pé
os dias vão; as noites, secas
as estações, outras; os trópicos, mais quentes
desencarcerado
volita-me da nuca um trabalho de homem

Como e brinco e rio
como caqui, homem sério, de quem me despeço
sério que de dia esteve aqui?
está logo em qualquer parte à parte daqui

Hoje penso, como antes, em minha face adulta
que até ontem não me serviu caquis nem frutas boas
que até a véspera de hoje, por seriedade, não comeu
mas se negadas as brisas de ontem
mas se apartadas daqui as setas do ar que passa
recupero em tempo os aceptores - à ascese em mim
meus braços-cachos rajados no ar


O ar seco leva e a tudo seca
pois não levaria o enxarcamento, o transbordamento?
hoje vivo seco, embora coma caquis

e mais leve, a bem daqui, o pouco que não perco
vivo seco

quarta-feira, 7 de outubro de 2009


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agora vejo.

eu não tinha esses olhos
pintei os cantos dos olhos com haicais

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domingo, 4 de outubro de 2009

Contraponto

Resolvi parar com isso de ficar suando quieto e pensei de que modo ia dizer o troço entalado na garganta (de nós todos interpretantes): como e por que diabos essa gente da literatura faz? Não era das profundas. Pensei não ser. Nesse mundo de Deus a superfície vai sobre as balizas do alto contraste. E decidi expressar minha pura opinião, derivada de um surrupio, se é mesmo verdade que os pareceres da gente vêm daqueles outros que nos mostraram coisas espantosas para marcar um caminho de pensamento. Ao que não se sabe dá-se um estofo e pronto, fica-se sabendo. É proveitoso não saber se para se preencher o vácuo. E vamos em frente, fazendo da terra abandonada que trabalháramos, mesmo sem saber, para adquiri-la por usucapião. Ahhh! Eu queria tanto pegar nos cânones e de como são, de todos os tempos, usurpadores da terra alheia...

Peguei um papel amarelado de velho, sob uma janela da qual escapava luz de dia. O lápis ainda mais velho, tudo velho de tanto repetir seu uso. Escrevi numa ordem de resposta como houve uma ordem de pergunta prévia, a relembrar: "a) como e b) por que diabos... (essa gente da literatura faz?)" O porquê era o grande clímax, e não podia figurar logo no começo. Eu o guardaria bem para o fim ou, melhor, sequer o diria. Isso! Dos dois ele era o ponto que mais, aos antipáticos às letras, interessava ter, esses que alimentam a teoria de que o literato é um sádico à procura de fazer pouco o entenderem; ah, esses antipáticos adorariam ouvir isso de quem quer que seja, mesmo de mim. Quem sabe? Mas não é o caso agora. Eu deixaria para o final e mesmo no prelúdio não o diria. Já o como de fazer texto, esse demoraria mais, mais complicadinho de tratar, pediria mais espaço, atolaria o ritmo, sendo perfeito para um desenrolar de expectativa acerca do porquê – o porquê! – que não quer calar nessa coisa batedora.

Então parei. O porquê é uma supressão.

Não deve de ser aventado.

E eu que o conformaria a um conto de tese? De que motivo maltratar assim a cabeça?

Vou contar pelo menos desta vez: eu queria era traumatizar, ferrar logo com uma má experiência do texto, a má experiência dos últimos nobéis e mesmo deles o mais existencialista, para que não se andasse mais aos calcanhares dessas abstrações que são tratados sobre as coisas; era desenbocar num senso de concretude incompleta, a inquisitora, a mais clara, a mais patente de todas. Ela não insere respostas nas coisas. Quem acha as soluções – ora, e não é senso que são muitas para uma mesma e mesmo às mais impositivamente binárias – somos nós, sedentos e sedentários.

Sedentários de quê? Olhei o sol pela janela e me ofuscou a vista, o malditinho. Os literatos lá escrevem por profissão? Quando escrevem, acho que é porque deram na telha, como uma pomba tarada num dia de sol forte. Aharara-pa-pá! É uma piada! Pus aqui um ponto e uma expectativa que, foda-se, é intangivelmente necessária.

Ressoante

Haverá mil notas incansáveis,
Vezes mil. A música
É mais que a passagem:
Um dia sei que não estarei morto.
Ouvirei baladas novas, que sei,
Na esquina, ao poste, a todo canto,
O eterno retorno ventando,
O real dialogismo russo, ou até o alemão.

Pelo menos duas vezes chorarão por mim:
No rebento da vida;
Na morte certa.
Mas tão somente tudo de novo:
Os tremores do som que codifica o Tempo.
- E redivivo
Nascer, morrer, renascer... em alguém, uma luta?

O fato é um, sendo fato único,
A corda bamba uma, por que passamos
entre animal e super-homem, musicada.
Mil pronunciamentos
Muitos multi-infernos
Brandir seco de marretas
Recolherem no Tempo:
Letras... Letras...

No caminho, que haverá o código –
da bamba corda, tirada a partitura –,
Fazer da vida, da gente dura?
Projetar-se ao longe pródigo
Um pouco mais que a longa brisa.
O pouco engana o Tempo, como Rhea
Se o destino quer, a Letra posteriza.

Pó de armário

palavra cinzenta
debaixo do armário
não pode encontrar-se

ou suspeitar-se
sem que seja tempo
E não existe tempo
nem há tempo
nem tempo

a palavra cinza
a palavra-ferro-em-folha
gravada, já pronta e tabelada
vai feita no pó cinza
com que neutraliza uma geração

geração não inquire
corações não enfartam
cores não variam
cortes, sangues, mortes
os que sabemos, não delatam

como poeira insuspeita
a cor-ordem
se escorre de debaixo do armário
e serpenteia para além do armário
em campos magnéticos – e como os veremos?

projetada, calculosamente
o palavra pó de ferro
galvaniza o último espasmo
do último espanto
em cascas

a cor do poder
(não da palavra)
a cor-poesia que se pede tanto
craquela essa ordem das coisas, pelo amor de deus!

Muito pouco

Eu fiz muito pouco do dia
Muito
Muito pouco mesmo
Do dia o que eu fiz – muito
Pouco muda as coisas
Quase nada

Nesse dia as coisas não pararam
As pessoas acordaram dormindo
Suaram entre o concreto morno
Mataram sede, fome e gente
Ganharam dinheiro
Dormindo
Para dormir em paz no fim do dia
Para amanhã fazer muito mais

Mas eu...
Eu fiz muito pouco do dia
Muito
Muito pouco mesmo
Do dia o que eu fiz – muito
Pouco muda as coisas
Quase nada

Pelo muito que fizeram dormindo
Eu vou dormir em claro
Para amanhã fazer muito menos

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Promessa no quarto do Anhangabaú

Amanhã vou fazer um poema
E se amanhã eu não tiver a arma com que fazer o poema
Terei morrido de guardá-lo esperando à noite

Chamam-me, por essas, de hipocondríaco negativo pessimista
– Só por falar da morte, é, senhores? Onde estamos?
Eu disse que vou escrever
Agora preciso esquecer para chegar amanhã à forma filtrada e silenciosa do amor
Vejam como está desengonçado

Pensei na morte como quem aventa o improvável
Que implicância e que esquivância sobre a morte
Falei da morte como quem fala: "boa noite"

Mas principalmente o que eu quero é amanhã
Vou fazer um poema
Amanhã vou fazer um poema

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Desvínculo

Tive erros, homem sério, errei.
Esgotados, errei todos que consegui.
Retalharam tudo, estas mãos rudes...

Tive erros – amenos, frios, gelados –
Aterrissaram na ponta dos pés,
Entrementes eu, deitado à verdade tropical,
Dormia numa ilha do frio próximo.
(Não gritei antes?: fora!) os erros
Escorreram pelos acidentados planos da infância.

Daí essa mancha instalada no espírito,
Pousada e plena e forte e triste;
Pois tive erros, homem sério, errei,
A todo vão livre de vida.

Como é dolorido este hematoma no rosto.
Não saber deixar de se esconder, perder
Dos olhos humildes aquele antigo sol:
Eles olham de lá do cabeçalho da infância.

Eu só tenho uma chance que gira, girassol,
A que me agarro gritando: – homem sério!
Sorria uma vida; vida é solta
Retoma pelo menos as mãos quentes.
Mas sofreram nas rudes.
- Como volto, agora?

Tive erros, homem sério, errei.
Olhe de novo quando secarem?

A luz do esperado dia tropical
Quer aquecer um outro cabeçalho.
Evapora, homem-luz, o choro ingênuo.
Evapora, homem-luz, que eu também amo
O sol que não se toca sem ter vez.

sexta-feira, 31 de julho de 2009

Passagem da marcha


Choveu ont’um bom tanto
__um tanto
Morreu ontem num canto
__contente
O defunto: no rosto,
__um sorriso
Afogado, boiou
__’qui por perto

Vai! Passou? Vai passar.
__vai, passado!

Mas alguém, quem, vem ter
__ao meu lado...

Quem vir cá, vem tocar
__marchas novas
Vem nos passos levar
__meus defuntos
Seguiriam dançar
__noutros mundos
Um futuro de marchas
__vermelhas

Quem vir cá, não se veste
__de dor
Quem vir cá, de vermelho
__se veste
Vai que seja o passista
__dos mundos
Em quem nasce uma amora,
__um amor...

Vou cantar, vou mamãe, oh!
__vou antes
Que tu voltes bater às
__mi’as costas
Oh! mamãe, vou cantar:
__mãe eu quero
O passista dos mundos
__num beijo
Que me leve os defuntos
__infantes

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quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Entre o Louco e o Cadáver

As Bodas de Fígaro, Abertura
Mozart

Pela manhã Zaratustra afastou-se de sua casa e do descanso de sua casa para o trabalho nas colinas de estanho. Passou dez horas soldando circuitos em grandes chapas de silício sem que uma só descambasse para a retífica. Essas dez horas, porém, foram de uma desatenção clínica e de pensamentos soltos. Pela primeira vez em dez anos dez horas consecutivas sem retífica, e descuidadamente, o enlevaram:

"Estou enfastiado de minha sabedoria!"

Ao fim do dia Zaratustra desceu ao vale como quem rola pronto a derrubar alguém. No vale acontecia um número de equilibrismo público que não acontecia sempre. Certo acrobata, de braços abertos e sapatilhas e seu colorismo de roupas coladas de um jeito que nem sempre acontecia, andava sobre o cabo tenso, de um cume ao outro das colinas de estanho; atraia em si todo povo. Abaixo e em meio à multidão, a voz de Zaratustra rasgou a indignação pública, sem contudo desempertigar o equilibrista, falando assim:

"Abismem!, que se apresenta aos senhores um louco sobre suas cabeças; um louco, a tal altura que tomates e outras frutas podres não o podem alcançar mesmo os bem lançados.

"A julgar pelas órbitas de seus olhos, e como as giram, os senhores do público se amotinam e se corroem por dentro. Posso supor que desejem a queda do acrobata. Não aceitam estas retinas terem que lobrigar acima um número tão sem precedentes? Pois a mim não me deslumbra, homens – homens de couro rígido. Seus lombos estão açoitados por varas de luz e se enrijecem, as mesmas varas que os fatigam as retinas em soldas, naquelas colinas. Mas a mim hoje não me caíram sobre as costas.

"Chega a hora em que um homem, eu menos deus quanto todos dos senhores, rola da colina de estanho para assinalar o número equilibrístico a que compareci de abrupto, porém como eu estivesse de longe preparado para um tal acaso. Minha pouca surpresa não me permite confundir quem está suspenso no tesão do fio: é este o super-homem!

"O homem planta na terra e dela colhe os bens da terra. Aplica-se a mente a verdadeiras revoluções agrícolas, que se superam e o cansa de corpo e o encharca o colarinho. Dê-se fuga, porém, a qualquer suor de espírito e andará para mais perto do super-homem.

"Podem os senhores superar o homem e, no entanto, que esforço empregam nisso? É tempo de se aprumarem de seu próprio vazio. O fôlego entre uma e outra revolução agrícola, que espaço lhe dão, se logo pensam em tudo o que seja mais agricultura da solda e do estanho nessas colinas?

"Suas mãos manejam exclusivamente a flor da terra que se ensolara na colina e cresce. Mas senhores, de couro duro e nenhuma tragédia, como se ensolaram a si mesmos e se salvam do que soldam? Soldam seu próprio prazer em uma chapa, e reviram os olhos.

"Falta um pouco de prazer primário em toda vida.

"O risco de se dar a prazer, mas ao prazer bem mais fundo do que o de então, lança o homem de couro rígido ao primeiro passo no equilibrismo. Assim talvez não falte loucura e seu hálito se revigore.

"O homem pode tomar consciência de seu corpo, isso não sucumbirá a um bravo cachorro na rua. Nenhum gesto de consciência pode se anular à imoralidade pública a ponto de temer um cachorro. O principal cão, não o julguem externo, é o que o homem possui no corpo, e se a expressão corrente promete que ele seja algum demônio, não o digo bem isso. O cão, tão pior, vos vigia e vos pune.

"É tempo em que seus prazeres não se acabrunhem. Não deixem seus prazeres guardados em caixas separadas de seu corpo, enquanto se equilibram. São parte da mesma massa em risco de queda, a massa que é tudo e que é vácuo.

"O super-homem põe a seu serviço a investigação sexual de que falo; está aí a descobrir em si o outro que ainda é mais si do que a si próprio. A vida pueril suplica qualquer gesto de equilibrismo.

"O homem não tem emancipado seu hálito da terra e sua loucura não passa de uma cãibra física. O super-homem só com tamanha destreza se equilibra por haver guardado alguma cãibra de espírito.

"Vejam no alto quem deixou por um dia o seu turno e dedicou-se a um número de arte."

Ouvindo essas palavras, um senhor da multidão interveio:

"O que nos propõe o homem que rola das colinas? Veio atormentar nossas virtudes do trabalho e nossa dignidade? Por mais que nos interpele, não podemos todos subir à mesma corda do acrobata. Pois quem satisfaria a fome de nossos filhos?

"Não há corda para tantos pés, nem pés que sigam essa insanidade. Volta à colina e presta-se bem a seu serviço, homem louco. Não queremos ouvir suas anedotas sobre couro rijo, nem temos olhos fatigados mas honestos à luz em que trabalhamos. Vejo a demência em sua língua, o escárnio em suas caretas e sua lógica se obscureceu. Volta à solda e louva o esclarecimento que evola de seu maçarico."

Proposto o motim, o povo aglutinou-se às voltas de Zaratustra. Mas no alto alguém achou outro recurso: derrubar o equilibrista, sem quem Zaratustra não teria mais tema para enervar o público. Já subia o primeiro passo na corda um senhor de sapatos polidos e gravata marrom. Logo os olhares se redirigiram à corda.

O engravatado não se submetia à mesma mora do equilibrista. Correu aos calcanhares do inimigo, sem se dar tempo a desvios e à falta de acrobacia. Gritou num pulo:

"Corra, que piso seus calcanhares!"

E caíram ambos abraçados no espaço livre, bem sobre as costas de Zaratustra.

Zaratustra acudiu o equilibrista nos ombros; já estava morto. Com o fim do número, saiu do tumulto do povo, que se ocupava de ajudar o homem de gravata.

Andou Zaratustra por três dias e três noites sem que se desse conta de como ia longe, estando mais raras as casas e mais denso o espaço. Quando finalmente se desgastou de carregar o equilibrista, putrefato sobre seu lombo, descansou-o junto a pedra próxima e bateu à última porta de casa, atendido por um ancião de óculos – de meia-lua. Assim lhe disse Zaratustra:

"Veja aqui a imagem da tragédia pública e o morto que nela pesquei. Vimos de longe e estamos fartos de andar sem nenhuma conversa. Dá-me de comer e de beber."

O ancião retrucou ou relutou, ainda que voltasse logo carregado de cereais e água:

"Mas alimente primeiro o seu acompanhante, que parece estar mais exausto."

"Está morto, isso sim. Não o disse?"

"Isso pouco me importa, andarilho! Vem à minha casa e me pede alimento? Pois dê-lhe comida de comer e água de beber, e terá que comer e beber."

Nisso fechou a porta com vigor. Zaratustra não simulou qualquer alimentação do equilibrista, tomando para si as doações. Falou Zaratustra ao seu coração:

"Feliz do que dorme sem volta, depois de um número de arte. É ele o germe da terra e agora sabe ele a morte que o esperava. Que tenha sido um estouro de homem, agora que está morto não pode mais estourar e isso muito me importa. O último espasmo de vida desatou-o e esteve voando para a morte com a certeza ávida do nada."

E desembalou ainda outras palavras:

"Quem sou eu e o que falo? Sou qualquer coisa entre o louco e o cadáver. Comem, os cadáveres?

"Só sinto fome depois que como."

Assim falou Zaratustra ao seu coração.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Canto psicanalítico

De cedo diz meu pai que consumados
Homem com homem atos conjugais
São tola escolha, as toras naturais
Recusam por-se em frutas de viados.

Porém luto por Ciência aos esporrados!
E, incontinenti, vem-me Freud atrás
Dedando: "o inconsciente do rapaz
Fervilha seus tesões multifurcados!"

A benga erógena ama o mais galante.
Se gay é fruta, é natural que notem
A doce gala que esta glosa cante:

Pulsões totais, prazer, que deles brotem
Forças carnais! Fogo ao tabu e ao totem!
Morte ao pai duplo e nunca mais levante!